Resumo da notícia
Lastro integral e segregado passa a ser obrigatório para todas as emissoras.
Stablecoins estrangeiras só poderão circular via PSAV autorizada pelo Banco Central.
Auditorias independentes e regras de transparência fortalecem a proteção ao usuário.
O Deputado Federal Lucas Ramos (PSB-PE), apresentou para a Comissão de Ciência, Tecnologia e Inovação (CCTI) um parecer sobre o Projeto de Lei 4.308/2024 , que cria o primeiro marco legal brasileiro específico para stablecoins .
O PL altera algumas regras publicadas pelo Banco Central do Brasil para o setor e, de certa forma, torna o país menos atrativo para os emissores de stablecoins já que uma das regras exige segregação patrimonial dos ativos, algo que não ocorre atualmente.
O relator em seu parecer defende que o país vive uma fase de expansão acelerada dessas moedas estáveis e precisa de um arcabouço normativo capaz de garantir segurança jurídica, transparência, proteção ao usuário e compatibilidade com padrões internacionais, como o MiCA europeu e o Stablecoin TRUST Act norte-americano.
Conforme destacado no relatório, o país viu as stablecoins lastreadas em real saltarem de um volume negociado de R$ 4,9 bilhões em 2024 para R$ 6,5 bilhões em 2025, apenas até agosto, ultrapassando o total do ano anterior em menos de oito meses. O número de transferências também explodiu, passando de 5 mil em 2021 para 1,4 milhão em 2024 . Para o relator, esse crescimento acelerado transforma essas moedas estáveis em “infraestrutura central para transações on-chain no Brasil”.
Isac Costa, advogado e Diretor do Instituto Brasileiro de Inovação e Tecnologia (IBIT), aponta que o projeto referencia apena moedas fiduciárias como lastro, sem levar em conta ouro e commodities ou, ainda, cestas de ativos virtuais (como a DAI).
A eficácia da proteção ao investidor esbarra na fronteira digital, pois o Banco Central terá capacidade limitada de enforcement sobre emissores globais que optarem por não buscar licença no Brasil. A depender da flexibilidade na gestão das reservas e distribuição de lucros aos titularkes dos tokens, corremos o risco de abrir uma brecha para a estruturação de gestoras de fundos de investimento disfarçadas de emissoras de stablecoins, operando em clara arbitragem em face das normas da CVM.”
Emissão regulada pelo Banco Central
Outro pilar central do substitutivo é a atribuição direta do Banco Central (o que já ocorre atualmente) para regulamentar e fiscalizar a emissão de stablecoins no Brasil. Segundo o texto, só haverá emissão quando a entidade colocar ativos à disposição de terceiros mediante ingresso prévio de recursos, reconhecendo em seu passivo uma obrigação resgatável vinculada ao lastro.
O parecer também esclarece que operações internas de mint e burn, sem relação com terceiros, não configuram emissão, eliminando dúvidas operacionais que poderiam criar insegurança jurídica.
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O relator também estabelece que ativos referenciados em moeda nacional devem ser registrados a valor justo nos balanços corporativos, alinhando o setor às melhores práticas contábeis internacionais.
O texto aprovado evita regular diretamente emissores estrangeiros, mas cria regras rígidas para a circulação de stablecoins internacionais no Brasil. Qualquer oferta, troca ou distribuição desses ativos dentro do país só poderá ocorrer mediante intermediação de uma PSAV autorizada pelo Banco Central, conforme o Marco Legal dos Criptoativos .
As PSAVs terão de verificar a legitimidade do emissor; analisar sua governança; examinar as condições de lastro; documentar avaliação de risco quando o país de origem não possuir supervisão prudencial compatível.
O texto também cria uma regra de safe harbour, garantindo que a PSAV não será responsabilizada se provar que cumpriu seus deveres de diligência, um mecanismo importante para mitigar riscos jurídicos e operacionais.
Lastro: regra central da nova lei
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A obrigação de lastro integral é o ponto mais sensível e decisivo do substitutivo. O texto determina que toda stablecoin emitida por entidade brasileira deve ser 100% lastreada pelos ativos ou moedas especificados. É proibida qualquer emissão sem a respectiva reserva.
As emissoras deverão ainda, manter reservas segregadas e auditáveis; divulgar informações claras sobre a composição do lastro; realizar auditorias independentes periódicas; publicar os principais achados das auditorias; disponibilizar o relatório integral ao Banco Central.
Se o lastro estiver no exterior, o Banco Central poderá exigir garantias adicionais, reduzindo riscos de insolvência e fuga de recursos .
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O relator reconhece que o lastro pode gerar rendimentos, como juros de depósitos, títulos públicos ou instrumentos financeiros de liquidez. O substitutivo estabelece que esses rendimentos são de livre movimentação para emissoras e PSAVs, podem ser distribuídos aos usuários e não caracterizam oferta pública de valores mobiliários, evitando conflito com a CVM.
Essa distinção reforça a independência do marco de stablecoins em relação ao regime do mercado de capitais, mantendo o Banco Central como órgão principal do setor.
Emissoras brasileiras terão de implementar estrutura de segurança cibernética proporcional ao porte e à complexidade de suas operações.
Além disso, o PL aprovado pede mudança no art. 171-A do Código Penal e, desse modo, passa a ser considerado crime colocar em circulação ativos virtuais estáveis sem a correspondente reserva de lastro, com intenção de obter vantagem ilícita e induzindo terceiros ao erro. Essa tipificação criminal endurece o combate a práticas fraudulentas e reforça a exigência de que toda emissão de stablecoin esteja respaldada por um lastro real, conferindo maior segurança ao consumidor e ao sistema financeiro.
Prevenção à lavagem de dinheiro
A nova legislação aprovada estabelece regras rigorosas de prevenção à lavagem de dinheiro para o setor de stablecoins, determinando que todas as emissoras adotem políticas de PLD/FTP proporcionais ao nível de risco das operações que realizam. O texto deixa claro que essas instituições deverão identificar e qualificar seus clientes, comunicar prontamente ao COAF qualquer operação considerada suspeita, manter registros completos e atualizados e cumprir integralmente as obrigações previstas na Lei 9.613/1998.
Além disso, as prestadoras de serviços de ativos virtuais que intermediarem stablecoins emitidas no exterior também serão obrigadas a manter registros transacionais detalhados e a observar normas específicas de prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo, garantindo que não haja brechas regulatórias para emissores internacionais.
No eixo dedicado à proteção do usuário, o substitutivo determina que as emissoras forneçam informações claras, completas e corretas sobre todos os aspectos essenciais dos ativos oferecidos. Isso inclui a explicação transparente dos riscos envolvidos, a descrição da natureza e da composição do lastro, o aviso expresso de que não existe qualquer garantia governamental associada ao ativo e a apresentação dos procedimentos de resgate.
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Para o relator, esse conjunto de medidas reduz a assimetria de informações entre empresas e consumidores, fortalece o consentimento informado e oferece ao usuário condições mais seguras para decidir se deseja ou não adquirir ou utilizar tais ativos. Segundo ele, esse é um princípio fundamental para produtos financeiros digitais cuja dinâmica pode ser complexa para parte do público.
O parecer esclarece que transações envolvendo stablecoins não serão consideradas automaticamente como entrega de moeda fiduciária, o que evita interpretações equivocadas no âmbito das normas cambiais.
O parecer ainda precisa ser votado pela Comissão e depois, se aprovado, será analisado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania; pela Comissão de Desenvolvimento Econômico e pela Comissão de Finanças e Tributação. Após a análise, e aprovação em cada comissão o relatório final aprovado é submetido para aprovação no Plenário da Câmara e, depois de aprovado, segue para o Senado.


