Como aplicar o framework de avaliação bancária às empresas de tesouraria de Bitcoin

Autor: Andrej Antonijevic, Fonte: Bitcoin Treasury, Tradução: Shaw Jinse Finance

Introdução

Os bancos existem de várias formas há centenas de anos. Seu modelo de negócios geralmente se baseia em um mecanismo econômico simples: eles captam depósitos e usam essa base de fundos para oferecer produtos financeiros como hipotecas, empréstimos corporativos, serviços de pagamento e facilidades de crédito. A diferença entre o rendimento dos ativos e o custo dos passivos constitui a base de sua lucratividade.

Devido à prevalência, regulação e mensurabilidade desse modelo de negócios, os mercados de capitais desenvolveram métodos claros de avaliação bancária. Um dos métodos mais amplamente utilizados é o framework de Preço sobre Valor Patrimonial (P/B), que vincula diretamente a avaliação do banco ao seu retorno de capital próprio de longo prazo, custo de capital e taxa de crescimento sustentável.

Com a chegada do século XXI, surgiu um novo tipo de entidade de balanço: as empresas de reservas de tesouraria de bitcoin. Essas instituições emitem capital denominado em moeda fiduciária (dívida, ações preferenciais ou patrimônio), utilizado para adquirir e manter bitcoin como parte de uma estratégia de gestão de fundos de longo prazo, tratando o bitcoin como um ativo de capital. Apesar da diferença nos ativos subjacentes, a lógica econômica é bastante semelhante: tanto bancos quanto empresas de tesouraria de bitcoin realizam transformação de capital e, portanto, podem ser analisados com os mesmos princípios de avaliação.

Este artigo mostra como o framework de Preço sobre Valor Patrimonial utilizado pelos bancos pode ser aplicado diretamente às empresas de tesouraria de bitcoin, permitindo que investidores usem um método de análise aplicável e coerente para avaliar seu valor.

Framework de Avaliação Bancária

O framework de avaliação P/B dos bancos pode ser expresso como:

Onde:

• ROE é o retorno sobre o patrimônio líquido do banco,

• r é o custo do patrimônio (taxa de retorno exigida pelos investidores),

• g é a taxa de crescimento de longo prazo do valor contábil por ação e dos dividendos.

Se o retorno sobre o patrimônio líquido de um banco for exatamente igual ao seu custo de patrimônio (ROE=r), seu preço de negociação será igual ao valor contábil. Se o ROE for superior ao custo do patrimônio, seu preço de negociação será negociado com prêmio. Se o ROE for inferior ao custo do patrimônio, seu preço de negociação será negociado com desconto.

Essa lógica é a base do framework P/B e constitui a ponte conceitual para as empresas de tesouraria de bitcoin.

Aplicando o Framework P/B às Empresas de Tesouraria de Bitcoin

As empresas de tesouraria de bitcoin podem ser analisadas com a mesma lógica de avaliação. Seu valor contábil é seu valor líquido dos ativos (NAV), ou seja, o patrimônio em bitcoin e o patrimônio em caixa que possuem.

O retorno sobre o patrimônio de uma empresa de tesouraria de bitcoin é composto por três partes:

1. Valorização do preço do bitcoin em moeda fiduciária

2. Quando novos fundos são captados a um preço superior ao valor líquido dos ativos (NAV), ou quando o financiamento permite que a empresa aumente sua posse de bitcoin por ação mais rapidamente do que um investidor passivo, ocorre valorização do bitcoin por ação (retorno BTC).

3. Alavancagem, ou seja, efeito multiplicador.

Portanto, o indicador relevante de retorno sobre o patrimônio líquido é:

Onde:

• g_BTC = crescimento do preço do bitcoin em moeda fiduciária,

• a = valorização do bitcoin por ação (retorno BTC),

• L = índice de alavancagem (percentual da dívida sobre o total de ativos),

• f = custo da dívida.

Essa expressão é semelhante à equação de retorno sobre o patrimônio líquido (ROE) dos bancos: rendimento operacional menos custo de financiamento, ajustado conforme a estrutura do balanço.

Ilustração do Framework

Para demonstrar como esse framework funciona na prática (não baseado em valores estimados específicos, apenas para fins ilustrativos), considere os seguintes parâmetros:

• Valorização do preço do bitcoin: 15%

• Valorização do bitcoin por ação (retorno BTC): 5%

• Índice de alavancagem: 30%

• Custo da dívida: 8%

Taxa de retorno composta da valorização do bitcoin e crescimento do lucro por ação:

O pagamento da dívida reduz essa proporção:

Resultando em:

O custo do patrimônio pode ser estimado usando o modelo de precificação de ativos de capital (CAPM), onde a taxa livre de risco é de 4% e o prêmio de risco de mercado é de 4%. Dependendo do coeficiente beta da empresa de tesouraria de bitcoin (por exemplo, entre 2,0 e 3,0, ajustado pela alavancagem), o valor do custo do patrimônio ficará entre 12% e 16%.

Nesses parâmetros exemplificativos:

Assumindo uma taxa de desvalorização de moeda de longo prazo (ou seja, inflação) de g = 4%, o resultado fica aproximadamente entre 1,2x e 1,8x o valor líquido dos ativos.

Isso não é uma previsão, mas uma demonstração do método: a avaliação reflete diretamente a relação entre ROE, custo do patrimônio e crescimento de longo prazo, exatamente como no caso dos bancos.

Por que essa analogia é válida

A simetria analítica entre bancos e empresas de tesouraria de bitcoin não é coincidência. Ambos dependem da transformação de capital:

• Os bancos transformam depósitos de baixo rendimento em empréstimos e ativos financeiros de alto rendimento.

• As empresas de gestão de fundos de bitcoin transformam fundos fiduciários em exposição a bitcoin, utilizando a gestão do balanço para aumentar o acúmulo de bitcoin por ação no longo prazo.

Em ambos os casos, a criação de valor depende da capacidade da instituição de manter um retorno sobre o patrimônio líquido (ROE) consistentemente acima do custo do patrimônio. Essa diferença de taxa decorre das seguintes vantagens estruturais:

• Vantagem de captação (acesso a fundos de baixo custo)

• Vantagem de gestão de risco e opções (timing e estrutura de emissão),

• Vantagem de franquia e confiança (capacidade de atrair capital de longo prazo de forma eficaz).

Esses fatores determinam o tamanho e a duração do diferencial entre o retorno sobre o patrimônio líquido e as taxas de juros, determinando se o múltiplo de avaliação será superior ou inferior ao valor líquido dos ativos.

Conclusão

O modelo P/B sempre foi a pedra angular da avaliação bancária, pois conecta a avaliação diretamente à economia subjacente do mercado de capitais. A mesma estrutura se aplica naturalmente às empresas de tesouraria de bitcoin:

Os lucros de ambas as instituições dependem do diferencial entre o retorno do capital e o custo do capital. Ao adotar o framework bancário consolidado, os investidores podem analisar as empresas de tesouraria de bitcoin a partir de uma perspectiva coerente e transparente, compreendendo como a estrutura do balanço, a disciplina de emissão e a valorização do bitcoin moldam conjuntamente sua criação de valor de longo prazo.

Se esse framework é aplicável aos bancos, ele também é aplicável às empresas de tesouraria de bitcoin, pois em ambos os casos a avaliação reflete, em última análise, a eficiência econômica da transformação de capital.